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Mario

Em maio de 1994 eu era apenas uma criança de 7 anos. De apartamento, por sinal. Todos sabem que a criança começa a lembrar de acontecimentos, por volta de seus 4 ou 5 anos, portanto, com 7 anos minhas memórias estavam apenas começando. Lembro bem daquele 1º de maio em que o Brasil todo parou ao perder Ayrton Senna. Penso que falo por todo o povo quando refiro que o sentimento era de incredulidade. Confesso que ainda hoje tenho essa mesma sensação quando a data se aproxima. Ficam tantos “e se?” pendurados, que chega a doer.
Mas, infelizmente, minha memória não alcança (provavelmente, porque o assunto foi Senna) outro personagem importantíssimo que faleceu na mesma semana: Mario Quintana. Morreu em 5 de maio e o grande poeta faleceu aos 87 anos com uma obra vasta e rica. É em sua obra que ele deixou toda sua riqueza, posto que não construiu patrimônios materiais.
Para quem tem um propósito de vida, pouco importa o patrimônio material deixado quando seu legado é a existência em si, essa sim, gigantesca e eterna.
Ao iniciar esse texto, fui buscar uma de suas poesias para compartilhar com os leitores e encontrei um tapa na cara para alguém que, como eu, que coloca definições em tudo: “A poesia não se entrega a quem a define.”
A poesia se distancia de alguém tão racional, tão objetivo, tão cético... Ao menos, tive a sensibilidade, graças aos meus esforçados professores de literatura, de perceber a magnitude de uma poesia. Sem a provocação deles, aos meus olhos seriam simples pensamentos traduzidos em palavras.
Quantas coisas da vida não podem ser definidas como X ou Y e nós teimamos em dizer: isso é azul, isso é vermelho, esquecendo do resto do arco-íris; isso é esquerda, isso é direita, esquecendo de tudo que está entre as pontas; esse é um bom sujeito, esse é um mau sujeito, esquecendo de reparar o contexto, esquecendo que pode ter sido uma atitude isolada e tantos outros conceitos não só desnecessários, mas também excessivamente simplistas à complexidade que compõe uma sociedade.
Mario Quintana sabia das coisas da vida. Nem tudo pode ser definido, nem para tudo cabem rótulos. Poesia é arte. Arte não pode ser definida pura e simplesmente e reflete diretamente a existência do ser humano em sociedade. Meu desejo nesse aniversário de morte de Mario Quintana, é de que a gente possa ler, escrever e se deleitar com a poesia. Alivia a nossa dura realidade. Para finalizar, poema de Mario, porque nunca é demais: “Os verdadeiros analfabetos são os que aprenderam a ler e não leem.”

Juliana Rebellatto Locatelli

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